ENFIM, FORMADA!
Vejo meus alunos se formando
e não tem como isso não me remeter ao dia em que fui ao CRP (Conselho Regional
de Psicologia) requerer minha carteira profissional. Eu estava emocionada,
muito feliz. Enfim, psicóloga. Sim. Psicóloga. Muito orgulho para mim: estar em
uma profissão tão linda, rica em conhecimentos e que me permitia ver as pessoas
pelo seu melhor lado, o lado do avesso. Saí de lá com meu número anotado em um
pedaço de papel e na esquina já mandei fazer meu carimbo. Agora eu seria
profissional, com carimbo e tudo. Pela carteira eu deveria esperar alguns
poucos dias. O que para mim pareceram uma eternidade.
Momento único o dia em que
voltei para pegar a minha carteira. Eu estava tão feliz que não podia me
conter. Comemorava ali os esforços que tinham valido a pena, as noites sem
dormir, os finais de semana sacrificados por todo o período da faculdade e sem
problema algum, os horários de almoço engolidos pela aula que eu queria
assistir até o fim e que já se esbarrava em meu apertado horário de trabalho.
Gostava dos livros como meus companheiros e não os deixava nem nas férias
escolares.
Ah! Teve outro momento único
também na psicologia: o dia em que minha mãe me deu de presente a coleção de
Freud. 24 volumes. Novinhos. Lindos!! Eu mal podia esperar para ler todos.
Fiquei encantada com a coleção e ela me acompanha até hoje. Tem lugar de
destaque na minha estante e se completa com um “Freudzinho” que ganhei de uma
aluna.
Ah! Mas teve também aquele
primeiro atendimento, no ambulatório da faculdade, à noite. Uma paciente que
esperava há meses na lista para ser atendida e que os colegas não escolhiam,
porque sua demanda estava relacionada a seu intenso medo de morrer. Prostituta.
Casada. Mãe de um filho. Marido ciumento. Tinha se tornado do lar. Sentia falta
do seu trabalho. E lá fui eu, munida de uma prancheta, papel e lápis, e de uma
satisfação sem medida. Não poderia deixar passar nenhuma palavra de sua fala e
tinha medo de me esquecer. Precisaria analisar meu próprio atendimento junto
aos livros e ao meu supervisor, por quem eu nutria uma intensa admiração. Então
eu anotava tudo o que ela falava. Ela pacientemente me esperava anotar para dar
seguimento à sua fala. Até o dia que me pediu, com muita educação e melindre,
que eu deixasse minha prancheta de lado, explicando-me que se sentia um pouco
constrangida de eu anotar. Nunca mais tive uma prancheta em atendimento. Daí
para frente descobri que minha atenção era completa na fala da paciente e não
havia motivo para anotar tudo na frente dela. Passei a fazer meus apontamentos
logo depois do atendimento e o relatório ao chegar em casa. Deixava-o dormir e
no dia seguinte fazia minha análise das minhas pontuações para levar todo esse
rico material à supervisão. Eu queria muito acertar no meu atendimento.
Ah! Mas teve também aquele
dia em que comecei a trabalhar, que foi antes mesmo da minha formatura...
Primeiro os grandes queimados, onde minha chefe era uma psiquiatra, que me dava
supervisão com jornadas de fantasias e discussões de casos. E logo na
sequência, em outro hospital, as crianças oncológicas, na sua maioria,
terminais. E vieram os pacientes adultos da oncologia, da neurologia, da
clínica geral... Cada dia mais pacientes e mais livros e mais relatórios. Neste
momento eu comecei a dar supervisão de estágio e passei a escrever textos para
ajudar meus estagiários. Daí surgiu meu livro “Ensaios de Psicologia
Hospitalar: a ausculta da alma”. Ensaios porque o conhecimento é sempre
inacabado e não se encerra em si mesmo, sendo aperfeiçoado ao longo da vida.
Mas isso é assunto para outro momento. Agora estou falando da minha carteira de
psicóloga. (risos).
É uma emoção que ainda posso
sentir, que revivo com cada um dos meus queridos alunos, uma paixão desmedida
pela psicologia que já dura 30 anos. E que é renovada a cada instante, em cada
paciente, em cada texto, em cada teoria.
Profissão? Psicóloga.
Susana Alamy
Psicóloga
Clínica e Hospitalar,
Psicoterapeuta,
Docente Livre
psicologiahospitalar.net.br
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